A Filosofia Africana
A
Filosofia Africana
Contextualização
do debate sobre a Filosofia Africana
O povo africano foi vítima da colonização europeia. Com
as viagens apelidadas de «Descobrimento», os europeus conheceram outros povos,
que foram julgados em comparação com os usos e costumes da cultura ocidental.
Por isso, houve uma série de filosofias concebidas por ocidentais que se
esforçavam por denegrir a personalidade dos negros no
mundo. Os estudos da época, quer antropológicos, quer sociológicos, preocupavam-se
em provar, em todos os sentidos, a superioridade dos povos do Ocidente em relação
aos outros povos, sem que estes últimos, no entanto, tivessem respostas imediatas
escritas para contrapor as teses dos ocidentais.
A Teologia, a Filosofia e o Direito desempenharam um papel
fundamental neste processo.
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A
Teologia definiu o povo negro como descendente de Cham, um homem que viu
a nudez do pai. Portanto, o homem negro aparece como símbolo de maldição. Neste
caso, o negro pertenceria a geração dos condenados de Deus.
·
Na
Filosofia, Voltaire afirma, na sua obra História do Século XIV, que o povo mais
elevado é o francês e o mais baixo é o africano; Jean-Jacques Rousseau diz
que os africanos são bons selvagens; para Hegel, os africanos são povos sem história
e, por consequência, desprovidos de humanidade; Kant chega a conclusão de que
os africanos são povos sem interesse; Levy Brhul proclama que os africanos
têm uma mentalidade pré-lógica; por sua vez, Montesquieu afirma que os africanos
são povos sem leis; os antropólogos Morgan e Tylor sustentam que a
África é uma sociedade morta.
·
O
monarca francês Luís XIV escreveu “O Código Negro”, uma espécie de
direitos dos senhores sobre os negros.
·
Não
restam dúvidas, portanto, de que o Ocidente desencadeou uma teoria de dominação
que gerou um profundo complexo de inferioridade nos africanos. Em Panafricanisme
ou Communisme? George Padmore diz que este facto provocou uma
crise no pensamento, na palavra e no agir do homem africano.
O ocidentalismo promovia, directa ou indirectamente, uma antropologia
triunfalista, cujas teorias e doutrinas exaltavam uma classe que se
autoproclamava herdeira excessiva da humanidade inteira. Por essa razão,
arrogava-se o direito de destruir, as sumir ou «esmagar» os outros
povos. Este tipo de antropologia poderia ser classificada como um verdadeiro «vandalismo»
cultural, narcisista, agressivo e destruidor, como defende Lecrec na sua
obra Critica da Antropologia.
O universo negro
O pensamento autentico negro não se pode
compreender senão pela referencia aquela que foi anteriormente a implantação
das religiões reveladas, o Cristianismo e o Islão, de que hoje esta fortemente
impregnado e as quais deve as suas especificidades africana. Alem disso, certas
etnias africanas que ainda não foram tocadas por uma ou outra das duas religiões
guardaram intacto esse pensamento.
Para mim, a originalidade da nossa ontologia e
o seu «fisicismo» fundamental. Creio que o pensamento negro ignora totalmente a
noção de um espírito imaterial. Para o negro, o universo e povoado por numerosos
e diversos seres, mas não necessariamente visíveis para o humano. Há, muitas vezes,
manifestações de uma presença que somente o iniciado (aquele que passou pelos rito...)
pode decifrar. Na minha etnia wolof Senegal,
nos consideramos que um animal, o cavalo, por exemplo, pode ver ou sentir um
desses seres que um homem não vê. Portanto, todos esses seres, evoluindo em
mundos diferentes, vivem no mesmo universo tocando-se e cruzando-se (se flolent
et se croisent). E isso faz-me pensar na teoria moderna de mundos pluridimensionais.
Os seres estão hierarquizados ate ao ser supremo, que, por vezes, e contundido
com o ancestral, sem jamais ser uma abstracção. São todas energias vivas, forcas
que estão submetidas ao princípio da interacção e que, como as forças na física
e na mecânica, podem adicionar-se, destruir-se e neutralizar-se. O reverendo Tempels
designava-os por «forcas vitais», e eu partilho totalmente a sua interpretação
da filosofia bantu.
Ao ministrar um medicamento, o curandeiro ou
«feiticeiro» tem a consciência de adicionar uma forca a uma outra e de destruir
uma terceira, aquela que esta na origem da doença.
A sua visão e, portanto, racional e coerente,
mas e uma racionalidade de um outro tipo, diferente da racionalidade dos
ocidentais. Somente o seu sistema de explicação e diferente da ciência moderna,
por exemplo da quimioterapia, que vê na cura de certas doenças reacções entre moléculas.
O negro não manifestará qualquer surpresa,
pois ele admite partida que todo o corpo contem uma «energia», que alguns designam
por «espírito», e que nos a podemos libertar mais ou menos brutalmente, mas pouco
importa a denominação. O europeu, salvo se for um universitário que estudou física,
vera nisso um propósito absurdo. E portanto, e o africano que tem razão. Assim,
o que e excepção no europeu e principio no negro.
·
Tempell
dizia que existe uma filosofia do negro,
só que esta e diferente na forma e no conteúdo da Filosofia europeia.
·
Por estas e outras razoes, os críticos opuseram-se a
existência de uma filosofia africana. Contudo, não podemos desprezar Tempels,
pois a sua abordagem tinha como fim o reconhecimento do Negro como homem pelos
colonizadores. Por conseguinte, os seus estudos contribuíram bastante para a
redefinição do relacionamento entre o Ocidente e o povo negro.
Filosofia
profissional e crítica a etnofilosofia
Os críticos da etnofilosofia defendem que não podemos
confundir o emprego do termo «Filosofia», usando-o no sentido ideológico.
«Filosofia» e uma palavra que se utiliza para designar uma ciência
rigorosamente científica. Reivindicar que os africanos têm a sua própria filosofia
seria cair nas mãos dos colonizadores, que querem dar ou manter a ilusão de que
os africanos têm uma filosofia, porque o que nos temos realmente são mitos, crenças
e provérbios.
Paulin
Hountondji (Benin) e um dos grandes
críticos e vale-se dos seguintes
argumentos, expressos na obra African Philosopy, Mythe and Reality, de
1974.
1. Reivindicando que existe uma Filosofia africana,
estamos a cair na ratoeira colonialista e racista que insiste que um africano e
diferente de um europeu. Portanto, qualquer referência a filosofia africana
obriga-nos a definir África em relação a Europa. Logo, não podemos aceitar que
haja uma filosofia africana que claramente nega a filosofia em geral.
2.Filosofia, no seu sentido restrito, e uma disciplina
cientifica, teorética e individual, assim como a Linguística, a Álgebra e,
portanto, não se pode substitui-las por crenças populares, práticas
tradicionais e comportamento popular de um povo qualquer. A Filosofia não se deve
identificar com o mito ou com a religião tradicional.
3. A Filosofia,
enquanto disciplina científica, teorética e individual, emerge sempre em
oposição ao mito, as religiões tradicionais e ao seu respectivo dogmatismo e
conservadorismo.
O que e dogmático
não pode ser filosófico.
4.Todo o projecto de edificar uma filosofia africana e um
projecto europeu de demarcar a
todo o custo a
civilização africana da europeia.
Por isso, dizer que os africanos têm a sua própria a civilização quer
dizer que a civilização africana e fixa e esta mumificada nas tradições
antigas, que todo o poder do africano residem no passado, nas tradições dos
seus antepassados. Os Filósofos que encaram a Filosofia a partir do ponto de
vista do passado designam-se por Etnofilosofos e são europeus. Tentam sufocar a
capacidade criativa dos africanos porque esperam que os filósofos africanos
sejam simples activistas das suas tradições culturais, em vez de pensadores
originais.
5. Todos
concordamos que a Filosofia africana não pode nascer ex nihil (do nada), mas que necessariamente parte da herança
cultural. Contudo, esta herança cultural não consiste apenas em olhar para
atrás. A filosofia africana deve ser uma confrontação criativa das suas ideias
com o presente e o futuro.
6. O papel criador da Filosofia africana tem de ser
desempenhado por filósofos africanos que são sujeitos da actividade filosófica.
A africanidade da Filosofia africana se emerge a partir de uma actividade
filosófica de discussão e critica dos africanos que são filósofos. A africanidade
consiste na pertença dos filósofos ao continente africano.
A africanidade não consiste em falar da África ou em
tratar de problemas africanos, pelo contrário, consiste na partilha e na
conversa contra africanos que são filósofos qualificados e profissionais que
usam razão de maneira crítica e criadora.
Hountondji afirma que o problema que se coloca e
substancialmente a associação da ideia
de filosofia a palavra
«africana», que a qualifica,
deixando em duvida
se a palavra «Filosofia» ainda
mantém o seu significado original.
Filosofia
política
Alem das teorias das Filosofias ocidentais
que mencionamos na contextualização histórica, os trabalhos forçados e a
escravatura contribuíram sobremaneira para a redução do
homem negro ao estatuto de coisa, de mercadoria susceptível de ser vendida e comprada, um
simples instrumento de trabalho e fonte de rendimento das economias ocidentais.
homem negro ao estatuto de coisa, de mercadoria susceptível de ser vendida e comprada, um
simples instrumento de trabalho e fonte de rendimento das economias ocidentais.
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